Por *João Ilo Barbosa
Creio que o leitor concorda que essa pandemia
fez mudar muita coisa em nossas vidas, nem sempre para pior. Em meio aos
inúmeros vídeos de whatsapp assistidos, um deles me chamou muito a atenção.
Versava sobre a gestão do tempo e começava com o seguinte questionamento: qual
o bem mais precioso que temos? Aquilo que não podemos pausar, repetir, alterar
ou comprar: o tempo! Podemos apenas vivê-lo até que se esgote por completo para
cada um de nós. O tempo, portanto, é um bem insubstituível que vamos perdendo a
cada dia, hora e minuto.
Dado seu expressivo valor, uma pergunta de
partida pode nos levar a um maior autoconhecimento: para que dedicamos boa
parte do nosso tempo? E porque temos atividades para as quais parece que nunca
sobra tempo? Ou seja: estamos ocupando nosso tempo realmente de uma forma
saudável e produtiva?
A crise da COVID 19 está gerando uma situação
bem peculiar com relação às questões levantadas. Nosso tempo foi reduzido
drasticamente para algumas atividades, como os deslocamentos no trânsito, e
aumentado para outras, como ler e cuidar da casa, por exemplo. Isto nos trouxe
ganhos e perdas. Menos tempo de trabalho quase sempre significa menor receita,
mas, por outro lado, podemos ter encontrado tempo para fazer coisas triviais,
prazerosas, mas esquecidas. Defrontamo-nos também com a falta de desculpas para
não realizar tarefas que antes eram objeto de postergação, com a eterna
promessa de que amanhã iríamos fazê-las sem falta.
Quando falamos em ganho ou perda de tempo, em
função do isolamento social, a expressão pode nos confundir. Como dizia Cazuza,
o tempo não para. De fato, o tempo não mudou, mas a quebra da rotina que nos
impunha a realização de diversas tarefas aumentou o valor de nossas escolhas,
de decidir o que podemos fazer do nosso tempo, transparecendo mais facilmente o
que, de fato, priorizamos.
A reclusão e a parada de afazeres rotineiros
proporcionam uma reflexão sobre como estamos gerenciando nossa vida, no sentido
de avaliar se estamos gastando nosso tempo finito com coisas que realmente
valem a pena. Em minha experiência pessoal, nesse período pude conviver mais
com meus filhos, que já estão grandes, já que as inúmeras atividades de todos
restringia essa convivência. Em quase três meses fizemos coisas para as quais
dificilmente "sobrava tempo". Pudemos cuidar da casa, muito mal, na
verdade, e preparar nossa própria comida. Aí foi um pouco melhor (Risos).
Também tocamos violão, cantamos e jogamos conversa fora.
O maior tempo juntos também trouxe atritos,
mas é quase impossível se abster dos problemas. Esses fazem parte da vida e
podem nos ensinar a superar desafios que a vida nos impõe. A maior lição que
tirei com a mudança da rotina foi a de que precisamos escolher melhor nossas
prioridades.
Que saibamos aproveitar o tempo da melhor
forma, mesmo com todas as limitações e exigências durante e após a pandemia. O
principal parâmetro para definir o que estou chamando de "melhor
forma" de lidar com o tempo é o quanto isso nos aproxima da felicidade.
Aliás, tempo e felicidade estão intrinsicamente relacionados. Estar feliz
sempre nos dá a sensação de transitoriedade. Quando nos sentimos felizes, o
tempo passa tão rapidamente que logo parece se esvair e já estamos de volta a
procurá-la.
Que em todo o tempo que nos resta possamos
olhar pra trás e pensar: vivi bem o tempo que já usei. Se isso não foi
possível, olhemos para frente com o objetivo de gastar nosso tempo com coisas
que realmente colaborem para nossa felicidade. É utópico sim, mas estou
dedicando mais tempo às minhas utopias.
Referência:
MARCONDES
FILHO, C. Perca tempo: é no lento que a vida acontece. São Paulo: Pia
Sociedade de São Paulo - Editora Paulus, 2014.
*Psicólogo Clínico. Professor
da Universidade Federal do Ceará. Mestre em Psicologia Clínica
pela Universidade de São Paulo. Doutor em Teoria e Pesquisa do Comportamento
pela Universidade Federal do Pará.
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