sábado, 31 de outubro de 2020

Luto e Pandemia

Por Eleonardo Rodrigues


A pandemia veio como um oponente forte e nos nocauteou em nosso ego, antecipando de forma drástica nossa forma de conviver, viver e morrer. O ditado popular: “A única certeza que temos da vida é a morte” tornou-se um imperativo de alta probabilidade para negacionistas e uma atitude de resiliência para os esperançosos e amantes da vida.

Imagem: Pixabay.com

Esses oito meses de isolamento e/ou distanciamento social nos convidou a nos reinventarmos dentro de um processo histórico em andamento...onde crenças foram ressignificadas pela quase morte e morte de entes queridos. Há quem mudou suas crenças nucleares empaticamente pelo sofrimento do outro mundialmente, há quem quase morreu e não aprendeu a lição e segue na sua idiossincrasia. Portanto, não devemos esquecer que coisas ruins acontecem com boas pessoas e que a natureza segue seu compasso suave e bela quando respeitada e, avassaladora e trágica quando desrespeitada.  


Contudo, o amor, o perdão, o bom senso, a fé, constituem alimentos afetivos fundamentais para os que ficam e reaprendem com humildade e serenidade a aventura e a graça que é o viver. Mas, quando e apesar do suporte dessa rede afetiva você ainda sofre muito adoecendo física e emocionalmente, a sugestão é buscar ajuda profissional.


quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Colocaram um feitiço em você?!

 I Put a Spell on you/Eu Coloquei Um Feitiço Em Você (Nina Simone)

Fonte: https://www.vagalume.com.br/nina-simone/i-put-a-spell-on-you-traducao.html

 

Eu coloquei um feitiço em você

Por que você é meu

 

É melhor você parar de fazer o que faz

Eu não minto

Não, eu não minto

 

Você sabe que eu não suporto mais

Você está dando desculpas

Você bem sabe

Que eu não posso suportar

porque você me derruba

 

Eu coloquei um feitiço em você

Por que você é meu

Você é meu

 

Eu amo você

Eu amo você

Eu amo você

Eu amo você de qualquer jeito

E eu não ligo

Se você não me quer

Porque eu sou sua agora

 

Você me ouviu

Eu coloquei um feitiço em você

Por que você é meu

 


     Que linda canção composta por Jalacy Hawkins, lançada em junho de 1965,  na voz estrondosa da magnifica Nina Simone. E você está enfeitiçado(a) pelas redes sociais? Será que o que você pensa é mesmo tudo de sua autoria com influências saudáveis, mas subliminarmente misturadas com ideologias manipulativas? Às vezes nossas crenças podem ser irracionais! Vejamos: Tudo se trata hoje com um passo de mágica virtual, tudo se resolve, basta seguir tal tutorial, será? Há problemas que resolvemos em curto prazo, outros em médio, alguns ao longo e outros talvez não se resolvam, pois muitos fazem parte de nossa biografia biopsicossocial da inalienável aceitação de si. 

     A sociedade do espetáculo nos seduz com a embriaguez do excesso de exposição. Ah, como é bom ser curtido, ter milhares de seguidores, meu sistema de recompensa cerebral vibra e fica super excitado: quero mais, quero mais, quero mais...não consigo parar...Então, aonde você se perdeu no meu do caminho? Será que fui enfeitiçado por um lobo na pele de cordeiro? Estou conseguindo ver mais claramente que toda essa exposição é boa, mas devo ter senso crítico? Devo filtrar e não reforçar likes e curtidas manipulativas por mais sedutoras e legais que se apresentem? Pensar sobre nosso próprio pensamento de forma crítica é partimos de uma tese, saber qual sua antítese e chegamos a uma síntese com bom senso. Tais inquietações desse feitiço foram feitas semelhantemente na idade média, revolução industrial, pós-modernidade e agora na pós-verdade. De que lado você quer estar? Do lado da alienação de massa com direito ao meu deleite histriônico ou do lado de que ninguém ou nada sozinho é uma panaceia?

     Espero ter começado a despertar você do transe desse feitiço dos algoritmos das redes sociais que tem a pretensão de vender tudo por um preço de custo barato mexendo com nossas emoções que na grande maioria das vezes não sabemos a qualidade de seu conteúdo mental privado que o antecede e o determina, mas é bem estudado pelos manipuladores das vendas e do mercado que acreditam e provam que temos um preço e somos presas fáceis quando não pensamos em coletivo de forma responsável e com autocrítica. 

     Queres continuar enfeitiçado? Não? Então sugiro assistir ao documentário “O dilema das redes”.



Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=ua2k52n_Bvw

Gravadora Philips Records em 1964-1965.

sábado, 17 de outubro de 2020

Estimulação Cerebral Profunda no Tratamento do Mal de Parkinson

 

O tratamento da doença de Parkinson e outros distúrbios do movimento com estimulação cerebral profunda (DBS) envolve a colocação de um pequeno dispositivo (chamado neuroestimulador) no corpo para fornecer minúsculos impulsos elétricos a condutores (fios) no cérebro. Esses impulsos corrigem a atividade cerebral que causa tremores e movimentos involuntários associados à doença de Parkinson e outros distúrbios do movimento. Os benefícios são geralmente visíveis imediatamente após o paciente acordar da cirurgia e o neuroestimulador ser ligado.

Os pesquisadores estão explorando aplicações para estimulação cerebral profunda além do tratamento para a doença de Parkinson. É assim que funciona. Gráfico: Adele Morgan / The Wall Street Journal. Vejam ao vídeo do WSJ.

 Link dos vídeos:




Fonte: Hospital Albert Einstein

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Encerramento da chamada do Laboratório de Neurociência Cognitiva - LabonC

 

É com satisfação que atingimos a quantidade ideal de pessoas interessadas para o primeiro projeto do LaboNC.

A partir de hoje a chamada do LaboNC se encerra.

Acompanhe o blog para as próximas chamadas no próximo ano.

 

Atenciosamente,

 

Prof. Eleonardo Rodrigues

Coordenador do LaboNC.

sexta-feira, 2 de outubro de 2020

Medo, Ansiedade e Terapia Cognitiva


Por *João Damasceno Neto


Créditos: Pixabay.com

 

Medo e ansiedade são experiências comuns à humanidade por ter servido à sobrevivência dos indivíduos e consequentemente da espécie. Pesquisadores diversos apresentam conceitos diferentes para medo e ansiedade. Beck e Clarck estabelecem que o medo é uma reação primária, automática, pré-consciente e involuntária a um perigo iminente, envolvendo aspectos atencionais, perceptivos, fisiológicos e comportamentais. A ansiedade é uma experiência mais complexa porque inclui elementos conceituais além de se reportar ao porvir, está implicada, portanto, com uma previsão do que acontecerá.

            As experiências de medo estão intimamente relacionadas com nossa filogenia, por isso podem ser consideradas primárias. Beck e Clarck, na revisão que fizeram da teoria cognitiva da ansiedade, consideraram útil para a explicação desse processo, falar de um modo de funcionar do organismo humano que batizou de modo de orientação. Modo é um conjunto de esquemas integrados, simultâneos, retroalimentativos e automáticos acionado frente a eventos vivenciados por uma pessoa. Modo de orientação é um conjunto de esquemas que rastreia os ambientes externo e interno. Com esse modo o sujeito busca identificar sinais negativos, positivos ou neutros, ou seja, suas valências e também sua intensidade como forte ou grave, intermediária, fraca ou amena.

            As características do funcionamento automático e pré-consciente do modo de orientação têm respaldo em achados de neurocientistas que pesquisaram as emoções e os processos neurofisiológicos envolvendo o sistema límbico. Aqui destaco os trabalhos de LeDoux, Davis, Anderson, Phelps entre outros. Esses pesquisadores descobriram que os processos sensoriais partem dos órgãos dos sentidos, como olhos e ouvidos, e enviam as informações para o tálamo. Esse órgão faz uma rápida avaliação pré-consciente e envia as informações para a amígdala por via direta e rápida. A amígdala é um órgão importante para a produção das reações subjetivas e objetivas do medo e da ansiedade. Nesse sentido, o construto cognitivo de modo de orientação tem apoio de duas fontes de conhecimentos diferentes: a ciência evolutiva e a neurociência.

            O modo de orientação, por fatores genéticos, pode ser mais sensível a detectar sinais negativos, predispondo o indivíduo a transtornos de ansiedade. Essa vulnerabilidade não é o único fator determinante desse tipo de problema psicológico. Outro modo de funcionamento primitivo, pré-consciente, automático e involuntário é acionado pelo modo de orientação, denominado modo de ameaça. O modo de ameaça é constituído por esquemas cognitivos conceituais de ser fraco quanto à ameaça e expectativas catastróficas; esquemas fisiológicos típicos de ansiedade; esquemas comportamentais de luta, fuga, esquiva ou congelamento; esquemas motivacionais básicos e psicossociais como metas e intenções e esquemas afetivos ansiogênicos.

            Esse modo funcional primitivo, acionado automaticamente pela detecção de sinais negativos pelo modo de orientação, produz consequências perpetuadoras dos estados de ansiedade, através dos vários esquemas supracitados: O esquema cognitivo induz a pensamentos automáticos e distorções cognitivas que maximiza o perigo e a catástrofe e minimiza o potencial do sujeito, interpretando o evento de forma irrealista, bem como a fisiologia e os sentimentos como provas da grandeza da ameaça e fragilidade para o enfrentamento. As distorções referem-se a um tipo de processamento de informação vicioso que não leva em conta todos os dados relevantes da realidade para determinada situação, É o que ocorre com a maximização dos fatos que confirmam o perigo e minimização daqueles que o redimensionariam para dimensão mais realista, ao reduzir os recursos pessoais e sociais de enfrentamento. Há muitos outros processamentos que distorcem a realidade. O esquema fisiológico leva à excitação das reações autonômicas. O esquema comportamental seleciona respostas inibitórias e defensivas de fuga ou esquiva. Essas respostas impedem que o sujeito cunhe fatos que contrariem suas crenças e pensamentos automáticos.

            A questão que se levanta é: se o modo de orientação é considerado universal por ser uma herança evolutiva importante para a sobrevivência, mas por questões genéticas ou congênitas pode estar enviesado para a detecção de sinais negativos, sendo capaz de subitamente acionar o modo primitivo de ameaça que também se desencadeia de forma pré-consciente, involuntária, reflexa e rápida, de tal maneira que é quase simultâneo ao modo de orientação, qual é mesmo o papel da terapia cognitiva nos transtornos de ansiedade?

            A resposta a essa questão envolve a capacidade humana de reavaliar os eventos externos e internos, ou seja, reexaminar percepções, pensamentos e conclusões iniciais rápidas através de um processo secundário mais lento, reflexivo, voluntário, mais trabalhoso e elaborado. A psicologia cognitiva classifica esse processo secundário de metacognitivo, uma vez que as cognições iniciais como as percepções e os pensamentos automáticos serão revisados por cognições mais complexas que levam em conta a coerência lógica e um maior número de fatos relevante para uma conclusão mais próxima da realidade. Esse uso do raciocínio lógico é semelhante ao usado pelos cientistas na produção das várias ciências, no entanto é bastante possível de ser usado pela maioria de nós mesmo no dia-a-dia.

            Na verdade, o exame secundário dos medos e ansiedades que nós sentimos a partir do modo de orientação e do modo primitivo de ameaça sempre ocorrem. A forma como essa avaliação é feita é que fará grande diferença quanto ao resultado numa forma mais realista e funcional de lidar com essas emoções e com o mundo ou na consolidação e perpetuação de um transtorno de ansiedade específico. A neurociência também corrobora com esse construto cognitivista. Os mesmos pesquisadores da neuropsicologia das emoções referenciados acima também afirmam que dos órgãos dos sentidos, as informações ao chegarem ao tálamo também fazem um trajeto mais longo antes de chegar à amígdala, conhecido como via indireta. Isto é, ao chegar ao tálamo, as informações atingem o córtex sensório-perceptivo correspondente onde são analisadas e avaliadas pormenorizadamente para então atingirem a amígdala. Trata-se de um caminho mais longo. Esse trajeto inclui também o córtex pré-frontal, importante para o raciocínio e na ação inibitória à hiperativação da amígdala.

            Caso o exame secundário seja fortemente prejudicado pelo modo de orientação e pelo modo primitivo de ameaça, seu resultado não adquire plausibilidade e por isso não consegue fazer frente àqueles modos superativados. Isso prejudica uma avaliação mais realista das capacidades pessoais de enfrentamento o que pode fazer o sujeito se esquivar ou agir de modo hesitante, produzindo resultados ruins que confirmam os esquemas. Nessa situação em que submetemos o exame secundário consciente a esses modos, tendemos a buscar sinais de segurança que reduzem imediatamente a ansiedade, sem desenvolver formas eficazes de enfrentamento. Esse processo também perpetua a ansiedade, pois o sujeito confirma continuamente que o evento é perigoso e não percebe e nem desenvolve suas estratégias eficazes de enfrentamento, mantendo seu autoconceito negativo.

            Respondendo mais diretamente ao questionamento feito acima. A terapia cognitiva pretende agir nesse processo de exame secundário, por se tratar de um processo metacognitivo, consciente, voluntário, elaborado e que pode ser aprendido e utilizado sempre que processos de ansiedade, depressão, agressividade, indecisão e outros problemas psicológicos nos assolem. Essas estratégias de enfrentamento ensinadas e vivenciadas na terapia cognitiva atualmente assumem caráter cognitivo, comportamental, relacional, fisiológico e emocional e estão baseadas em evidências. A terapia cognitiva pode anexar práticas terapêuticas como mindfulness e técnicas oriundas de outras abordagens, desde que devidamente adaptadas ao modelo cognitivo. Todas as estratégias, não obstante seu caráter ou origem, necessitam ter como selo unificador o fato de produzirem mudanças em crenças, esquemas, pensamentos e no processamento de informações. Dessa forma a terapia cognitiva assume seu caráter integrador, preconizado por Beck.

 

Referências:

CLARCK, D. A.; BECK, A. T. Terapia cognitiva para os transtornos de ansiedade. Porto Alegre: Artmed, 2012.

DOBSON, DOBSON, A terapia cognitivo-comportamental baseada em evidências. Porto Alegre: Artmed, 2020.

PLISZKA, S. R. Neurociência para o clínico de saúde mental. Porto Alegre: Artmed, 2004.

WENZEL, A. Inovações em terapia cognitivo-comportamental: intervenções estratégicas para uma prática criativa. Porto Alegre: Artmed, 2020.

 

*Psicólogo pela UNAMA. Mestre em Educação pelo IPLAC/UESPI. Especialista em Neuropsicologia pela UNINTER. Professor Efetivo do Curso de Psicologia da UESPI. Coordenador do Serviço Escola de Psicologia da UNIFSA.